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sexta-feira, 28 de agosto de 2009

UM VERBO NA BERLINDA

Muita coisa já mudou, outras esperam na eterna fila das reformas. A impressão é de que o Brasil está mudando mais depressa do que se percebe. Também se diz, mas não se escreve, que Lula é outro. Enquanto isto, com a impaciência histórica que o move, o brasileiro paga adiantado, com o voto, a candidatos que prometem apressar o futuro sem sair do passado. Mas quem acaba mal é a democracia.
Alguns hábitos mais cabeludos do cotidiano parlamentar estão na mira da opinião pública, embora a atual representação política, sem favor a de mais baixo teor entre todas, anda se lixando por entender que o problema, antes de recair sobre eles, diz respeito à democracia. O mandato parlamentar, utilizado para enriquecimento pessoal, em proveito de cada um e de todos, está mais valorizado do que nunca e, em respeito ao eleitor, já merecia ter cotação diária na Bolsa de Valores.
Ao cidadão se oferece agora a maneira mais direta para agilizar – é este o verbo do momento – a triagem nas urnas, num arrastão capaz de proporcionar uma tempestade na internet, pegar de jeito a campanha eleitoral e renovar no atacado a representação política. Agora (ou não se sabe quando) porque nada se aproveitará sem uma limpeza em regra. Até aqui, os deputados que o presidente Lula calculou por baixo em trezentos picaretas, devem ter extrapolado.Chegou a hora de remover o lixo histórico acumulado, melhorar a qualidade dos pretendentes e baixar o custo do mandato parlamentar. Sem esquecer de detonar a categoria privilegiada dos representantes sem votos. Imune à lei eleitoral e fora do alcance dos saudosistas da censura, a internet vai proporcionar, na tela, 24 horas de espetáculos por dia. Vamos ver se o Brasil realmente mudou, como evasivamente de diz em prosa fiada.
Há quem aposte que, no próximo ano, as urnas vão moer uma boa parcela de mandatos bichados e facilitar a vazão das crises acumuladas desde o mensalão. É tempo de botar para correr os políticos satisfeitos com esta agilização excessiva e estender a mão aos cidadãos que se sentem no fundo do poço. Quem mudou mesmo foi o presidente Lula, desde que o pré-sal trouxe grandes reservas de expectativa à vida brasileira. Tinha mudado quando ainda candidato e, para não ser reprovado pela quarta vez nas urnas, remeteu aos brasileiros aquela carta em que prometia deixar para as calendas gregas as tentações do esquerdismo em baixa universal. A vitória refez a cabeça de Lula e alguns até acham que ele mudou para melhor. Outros discordam.
O verbo agilizar está na berlinda e, se dona Dilma vier a ser eleita, vai continuar se explicando, até o encerramento da campanha, para dizer que declarou uma coisa e entenderam outra. Entenda-se o problema.Vai ver que a prioridade era mesmo para a primeira versão. Ao contrário do pré-sal, que já deveria estar jorrando discursos, o verbo agilizar vai reinar na campanha eleitoral e, se a candidata do PT for eleita, terá lugar de destaque no governo. Se ocorrer a vitória, o verbo da temporada chegará ao poder por mérito próprio, independente de quem seja eleito. Quem sabe o marco de uma nova era, com aplicações imprevisíveis. Será o Brasil agilizado.
Agilizar é o que dona Dilma Rousseff deveria fazer desde já. A começar por dentro do governo, independente de outros verbos. Todo verbo é o que é, e quem quiser o entenda com a liberdade que a democracia garante. Dilma pode dizer que pretendeu apenas garantir o direito adicional de encerrar conversa atravessada de pré-supostos ocultos.O pior é que o objetivo de compactar o público e o privado, que dona Dilma teria pedido a dona Lina Vieira como favor especial, apenas fulanizou a questão e permitiu à oposição jogar areia na engrenagem oficial de uma eleição que tende a ser o escoadouro de tudo que está pendente, no bom e no mau sentido. A questão do patrimonialisno parlamentar cedeu a prioridade à crise do Senado e só beneficia o PMDB na sucessão presidencial. E, se não for resolvida, voltará na primeira oportunidade. Tudo indica que o verbo agilizar ganhará autonomia de vôo, continuará sua rota e entrará num período de total versatilidade. Faz parte do enxoval da candidata oficial, que dificilmente dará conta de governar e, ao mesmo tempo, preservar o ex-presidente Lula dos desgastes de pequenas comparações entre governos. Diferenças rendem mais, eleitoralmente falando, do que semelhanças. Estatísticas têm duas faces, e só mostram a mais apresentável.
Lula escolheu uma candidata que preencherá apenas o intervalo entre o segundo e o terceiro mandato legal dele em 2014. Ao presidente caberá (olha ele aí) agilizar, como primeiro ministro, a administração da sucessora e, ao mesmo tempo, pavimentar o caminho para a volta. Sem o que, não teria sentido sacrificar o PT e premiar regiamente o PMDB. Lula não é de fazer pacto de morte com partido ou candidato. Mas não custa lembrar que, mais que um direito, a ruptura do elo entre o grande eleitor e o eleito tem sido e será sempre uma fatalidade decorrente da imperfeição humana, mais velha que a política. Ao verbo agilizar reserva-se longa sobrevivência no Brasil.
Quem já não é o mesmo, e só vai se dar conta depois que tiver sido, é o presidente Lula da Silva. Possivelmente só perceberá que deixou de ser aquele Lula da selva política no dia em que pedir um cafezinho e notar a perda de agilidade do serviço doméstico enferrujado pela má vontade que antecipa a condição de ex-presidente.Dizem que, depois de deixar o governo, as primeiras 48 horas parecem o fim do mundo. Mas não passam de fim de governo.
Escrito por: Wilson Figueiredo

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